Cabo 1 - Então Manel, tudo fino?
Cabo 2 - Tudo. Passei o fim de semana na terra. E voltei há bocado
Cabo 1 - Isso é que é vida!
Cabo 2 - Olha lá, António, tou aqui com uma dúvida.
Cabo 1 - Conta...
Cabo 2 - Quando se utiliza a expressão "dei um tiro no escuro", significa que se deu um tiro num preto??
Cabo 1 - (...)
Histórias, pensamentos e apontamentos para contar, partilhar e recontar. Episódios que aconteceram (ou talvez não), foram inventados, têm piada ou puxam à lágrima ou, simplesmente, apetece contar.
segunda-feira, 31 de março de 2008
sexta-feira, 28 de março de 2008
Os pensamentos dos outros
Frases e pensamentos para partilhar:
Sábio é o que está cheio de rectidão,
mas nem por isso ataca e
transforma os outros... É direito e contudo
não se dedica a endireitar os outros.
Lao Tse
(...) De certa maneira, apreendi em traços largos aquela piada cósmica - bastava pensar na imensidade, complexidade e antiguidade da China e na trivialidade da actual política do poder, entregue às mãos de cow-boys americanos ou de magnatas protestantes com a alma em Las Vegas... Sim, valia a pena rir. O riso dele era tão contagioso, que me vi obrigado a segui-lo, e juntos dobrávamo-nos em dois, até nos doerem as costelas e eu lhe implorar que parasse.
Lawrence Durrell, in Um sorriso nos olhos da alma
Sábio é o que está cheio de rectidão,
mas nem por isso ataca e
transforma os outros... É direito e contudo
não se dedica a endireitar os outros.
Lao Tse
(...) De certa maneira, apreendi em traços largos aquela piada cósmica - bastava pensar na imensidade, complexidade e antiguidade da China e na trivialidade da actual política do poder, entregue às mãos de cow-boys americanos ou de magnatas protestantes com a alma em Las Vegas... Sim, valia a pena rir. O riso dele era tão contagioso, que me vi obrigado a segui-lo, e juntos dobrávamo-nos em dois, até nos doerem as costelas e eu lhe implorar que parasse.
Lawrence Durrell, in Um sorriso nos olhos da alma
quinta-feira, 27 de março de 2008
No cinema
Fila 2, cadeiras 6 e 7
A pirralha de quatro anos olhou para a mãe e disse:
- Dá-me a mão.
Continuaram a ver o filme, naquele jeito de-mão-dada-como-se-não-nos-víssemos-há-semanas.
Fila 12, cadeiras 11 e 12
O rapaz beijou a namorada e pôs o braço nos seus ombros, em jeito de truque-que-aprendeu-no-cinema.
Ela olhou de lado para a mão dele e sorriu sem que ele visse. Também conhecia o truque.
A pirralha de quatro anos olhou para a mãe e disse:
- Dá-me a mão.
Continuaram a ver o filme, naquele jeito de-mão-dada-como-se-não-nos-víssemos-há-semanas.
Fila 12, cadeiras 11 e 12
O rapaz beijou a namorada e pôs o braço nos seus ombros, em jeito de truque-que-aprendeu-no-cinema.
Ela olhou de lado para a mão dele e sorriu sem que ele visse. Também conhecia o truque.
quarta-feira, 26 de março de 2008
Conversa de Surdos ao telefone
Pessoa 1 - Sabes lá... Espalhei-me de bicicleta e fiz uma luxação no dedo polegar...
Pessoa 2 - A sério? Que chato, e está muito inchado?
Pessoa 1 - Um bocado, dói-me muito. Hoje vou ao cinema.
Pessoa 2 - Mas consegues andar?
Pessoa 1 - Sim, consigo, claro.
Pessoa 2 - Mas vais de chinelos, é?
Pessoa 1 - Mas... magoei-me no polegar.
Pessoa 2 - Pois, deve custar-te muito a andar.
Pessoa 1 - (...)
Pessoa 2 - A sério? Que chato, e está muito inchado?
Pessoa 1 - Um bocado, dói-me muito. Hoje vou ao cinema.
Pessoa 2 - Mas consegues andar?
Pessoa 1 - Sim, consigo, claro.
Pessoa 2 - Mas vais de chinelos, é?
Pessoa 1 - Mas... magoei-me no polegar.
Pessoa 2 - Pois, deve custar-te muito a andar.
Pessoa 1 - (...)
Inspirações
Quando me contam o que está a acontecer fico perplexa. Quer dizer, sem reacção, sem saber o que pensar, o que dizer, o que fazer... Viro as costas, sem dizer uma palavra, e vou-me embora.
Entro no carro, ligo a ignição e não sei para onde ir... Continuo sem saber o que pensar, o que dizer, o que fazer... resolvo ir, mas não sei para onde. Apenas ir, andar, ver a estrada a passar por mim. E depois logo se vê onde vou parar. Apenas penso em ir para algum sítio que me deixe pensar, sem nada a incomodar-me. Limpo a mente e vou. Deixo-me ir.
Dou por mim numa rua sem ninguém, com alguns carros estacionados. Não sei onde estou e preciso de ir para algum sítio que me deixe pensar no que hei-de pensar, no que hei-de dizer, no que hei-de fazer. Fico ali parada, naquela rua sem ninguém, com meia dúzia de carros arrumados a pensar em nada. Só a olhar à volta, com aquela sensação de vazio que sinto por não estar num sítio que apenas me deixe pensar em paz. E sinto um formigueiro na cabeça, um desespero que sentimos quando precisamos que alguma coisa aconteça mas que, por qualquer razão, não acontece.
E vou andando, com alguma atenção, à procura de um sítio que me deixe em paz.
Dentro da minha carteira oiço o telefone a tocar. É ele, de certeza, mas não quero ouvir. Ainda não quero ouvir. Antes disso só preciso de me organizar um bocadinho.
Encontro a praia. É curioso que tantas pessoas precisem de ir à praia quando querem pensar, quando querem estar em paz, quando precisam de se encontrar. Não percebo porque será... Talvez seja por causa da sensação de ausência de limites. Como se nos sentíssemos a partir por esse mar fora, para nos olharmos como se não estivéssemos em nós. É como se fosse outra pessoa a contar-nos o que é melhor, porque tem o conselho de um azul, por vezes verde, outras vezes mais cinzento... É engraçada esta fixação pelo “olhar o mar”. Porque ele, de facto, nada nos diz... Mas ouve-nos... de alguma forma, seja qual for, ouve-nos. Ou faz-nos pensar isso.
Saio do carro e sento-me numa rocha. Lembro-me de vir aqui desde sempre. As recordações esboçam um sorriso em mim. O medo das algas! Pensava que por baixo das algas havia bichos que me podiam comer o pé... E o horror de nadar por cima das rochas, porque achava que ia aparecer um monstro qualquer do mar para me comer... Os lanchinhos da praia... o sal na minha pele... gritar para a minha mãe me ver quando fazia o pino...
E agora estou aqui outra vez. A pedir satisfações da minha própria vida. Acontece-me isto e nunca pensei que pudesse acontecer, depois de tanto tempo à espera...
Penso em mim. No meu corpo. Tenho vestidas umas calças pretas e uma camisa azul. Mas apetece-me branco. Apetece-me azul claro. E apetece-me amarelo e também verde água. E cor de rosa... apetecem-me cores clarinhas. Apetece-me sentir cheirinhos de alfazema...
Levanto-me e decido andar pela praia. Vou para a beira mar e começo a sentir os grãos de areia a entrar nos pés. Não gosto nada de ter areia nos sapatos e descalço-me. Enterro os pés na areia e lembro-me da minha avó, que fazia o mesmo porque faz bem aos ossos. E também ia à pesca para descansar a cabeça. E ensinou-me as primeiras letras. E lembro-me do primeiro postal que recebi. Da minha mãe, que tinha ido de férias com o meu pai. E era um postal com cinco linhas, que ainda hoje tenho guardado numa lata velha de chocolates. E demorei quase uma hora a ler esse postal. Lembro-me tão bem. Estava cheia de medo, porque o meu avô estava com os óculos, sentado ao meu lado. Ele estava com um ar muito sério, a apontar o dedo para o postal. E eu estava de pé, com as mãos atrás das costas a tentar decifrar as cinco linhas do postal da minha mãe, que contava que eles tinham encontrado uns gatinhos e todos os dias lhes davam leite. E foi um dos momentos mais mágicos da minha vida, quando percebi que as letras traziam palavras cheias de amor e traziam um bocadinho dos meus pais, que estavam de férias sem nós.
Olho à minha volta e reparo que a praia tem pouca gente. Ainda não há muitas pessoas de férias...
E volto a pensar no que me está a acontecer. E parece que, finalmente se faz luz na minha cabeça. E toco na minha barriga, para receber o ser que vai crescer dentro de mim. E tudo o que quero é dizer-lhe para vir depressa, porque quero tanto conhecê-lo. E tenho tantas saudades, sem nunca antes o ter visto.
Há tanto tempo que queria que isto acontecesse, mas nunca tinha pensado em como era mesmo. É uma vidinha linda aqui dentro. Assim muito pequenininha a precisar de mim. E, de repente, sinto-me mais forte que nunca, com força para aguentar tudo na vida porque tenho uma responsabilidade enorme. Enorme! Tão grande que nem tem nome! Porque é gigante e dá-me uma força incrível. Sinto-me uma super-mulher! Já tenho, dentro de mim, um filho que precisa que eu o proteja...
E estou tão feliz! Agora toda aquela sensação de estar perdida desapareceu. E apenas penso no que estou ali a fazer. Tenho que lhe contar. O meu marido tem que saber! Mas não quero dizer por telefone.
Entro no carro, ligo a ignição e não sei para onde ir... Continuo sem saber o que pensar, o que dizer, o que fazer... resolvo ir, mas não sei para onde. Apenas ir, andar, ver a estrada a passar por mim. E depois logo se vê onde vou parar. Apenas penso em ir para algum sítio que me deixe pensar, sem nada a incomodar-me. Limpo a mente e vou. Deixo-me ir.
Dou por mim numa rua sem ninguém, com alguns carros estacionados. Não sei onde estou e preciso de ir para algum sítio que me deixe pensar no que hei-de pensar, no que hei-de dizer, no que hei-de fazer. Fico ali parada, naquela rua sem ninguém, com meia dúzia de carros arrumados a pensar em nada. Só a olhar à volta, com aquela sensação de vazio que sinto por não estar num sítio que apenas me deixe pensar em paz. E sinto um formigueiro na cabeça, um desespero que sentimos quando precisamos que alguma coisa aconteça mas que, por qualquer razão, não acontece.
E vou andando, com alguma atenção, à procura de um sítio que me deixe em paz.
Dentro da minha carteira oiço o telefone a tocar. É ele, de certeza, mas não quero ouvir. Ainda não quero ouvir. Antes disso só preciso de me organizar um bocadinho.
Encontro a praia. É curioso que tantas pessoas precisem de ir à praia quando querem pensar, quando querem estar em paz, quando precisam de se encontrar. Não percebo porque será... Talvez seja por causa da sensação de ausência de limites. Como se nos sentíssemos a partir por esse mar fora, para nos olharmos como se não estivéssemos em nós. É como se fosse outra pessoa a contar-nos o que é melhor, porque tem o conselho de um azul, por vezes verde, outras vezes mais cinzento... É engraçada esta fixação pelo “olhar o mar”. Porque ele, de facto, nada nos diz... Mas ouve-nos... de alguma forma, seja qual for, ouve-nos. Ou faz-nos pensar isso.
Saio do carro e sento-me numa rocha. Lembro-me de vir aqui desde sempre. As recordações esboçam um sorriso em mim. O medo das algas! Pensava que por baixo das algas havia bichos que me podiam comer o pé... E o horror de nadar por cima das rochas, porque achava que ia aparecer um monstro qualquer do mar para me comer... Os lanchinhos da praia... o sal na minha pele... gritar para a minha mãe me ver quando fazia o pino...
E agora estou aqui outra vez. A pedir satisfações da minha própria vida. Acontece-me isto e nunca pensei que pudesse acontecer, depois de tanto tempo à espera...
Penso em mim. No meu corpo. Tenho vestidas umas calças pretas e uma camisa azul. Mas apetece-me branco. Apetece-me azul claro. E apetece-me amarelo e também verde água. E cor de rosa... apetecem-me cores clarinhas. Apetece-me sentir cheirinhos de alfazema...
Levanto-me e decido andar pela praia. Vou para a beira mar e começo a sentir os grãos de areia a entrar nos pés. Não gosto nada de ter areia nos sapatos e descalço-me. Enterro os pés na areia e lembro-me da minha avó, que fazia o mesmo porque faz bem aos ossos. E também ia à pesca para descansar a cabeça. E ensinou-me as primeiras letras. E lembro-me do primeiro postal que recebi. Da minha mãe, que tinha ido de férias com o meu pai. E era um postal com cinco linhas, que ainda hoje tenho guardado numa lata velha de chocolates. E demorei quase uma hora a ler esse postal. Lembro-me tão bem. Estava cheia de medo, porque o meu avô estava com os óculos, sentado ao meu lado. Ele estava com um ar muito sério, a apontar o dedo para o postal. E eu estava de pé, com as mãos atrás das costas a tentar decifrar as cinco linhas do postal da minha mãe, que contava que eles tinham encontrado uns gatinhos e todos os dias lhes davam leite. E foi um dos momentos mais mágicos da minha vida, quando percebi que as letras traziam palavras cheias de amor e traziam um bocadinho dos meus pais, que estavam de férias sem nós.
Olho à minha volta e reparo que a praia tem pouca gente. Ainda não há muitas pessoas de férias...
E volto a pensar no que me está a acontecer. E parece que, finalmente se faz luz na minha cabeça. E toco na minha barriga, para receber o ser que vai crescer dentro de mim. E tudo o que quero é dizer-lhe para vir depressa, porque quero tanto conhecê-lo. E tenho tantas saudades, sem nunca antes o ter visto.
Há tanto tempo que queria que isto acontecesse, mas nunca tinha pensado em como era mesmo. É uma vidinha linda aqui dentro. Assim muito pequenininha a precisar de mim. E, de repente, sinto-me mais forte que nunca, com força para aguentar tudo na vida porque tenho uma responsabilidade enorme. Enorme! Tão grande que nem tem nome! Porque é gigante e dá-me uma força incrível. Sinto-me uma super-mulher! Já tenho, dentro de mim, um filho que precisa que eu o proteja...
E estou tão feliz! Agora toda aquela sensação de estar perdida desapareceu. E apenas penso no que estou ali a fazer. Tenho que lhe contar. O meu marido tem que saber! Mas não quero dizer por telefone.
quarta-feira, 19 de março de 2008
segunda-feira, 17 de março de 2008
Relógio
Acordou às cinco da manhã todo transpirado, do calor desta estação que não sabe muito bem quem é. Tanto é frio como calor, como chuva! No meio da confusão de ter acordado pensava que tinha que haver outra razão. Talvez um sonho, um pesadelo... E um rodopio de pensamentos, de acontecimentos (mas aconteceram ou foram sonhados?) surge na sua mente. Ele continuava confuso, sem perceber muito bem porque não conseguia voltar a adormecer. Começa a adormecer e encontra sempre alguém no meio dos sonhos que faz com que volte a despertar... Até que toca o despertador.
Nem quer acreditar que o despertador tocou e ele dormiu a correr.
terça-feira, 11 de março de 2008
Sr. Arroz
O Sr. Arroz acordou com vontade de passear.
Escanhoou-se cuidadosamente, passou o after-shave pelo rosto fresco e deu umas palmadinhas para terminar.
Orgulhava-se de escanhoar-se em quatro minutos. Há anos que tinha o mesmo ritual. Misturava o creme de barbear na sua tacinha, mexia o preparado com o velho pincel de barba. Pintava a cara com o pincel, ate ficar uma grossa camada de creme. Passava a lâmina por água fria e tirava todo o creme.
De segunda a sábado, o ritual cumpria-se escrupulosamente. Só descansando ao domingo.
Num Natal, o Sr. Arroz recebeu uma máquina de barbear. Esteve que tempos até ter coragem de mudar o seu ritual. Não conseguia fazer a barba sem o seu creme de barbear. Mas a máquina dispensava o creme...
Passaram-se semanas, meses, outro Natal, até que a Sra. Arroz o confrontou. Ele tinha que experimentar.
O Sr. Arroz passou uma semana inteira a mentalizar-se. A máquina ficou todo esse tempo na casa de banho, como que a ver como era o ritual, feita fantasma a aterrorizar as suas manhãs outrora calmas e sem percalços e novidades.
No dia definido, o Sr. Arroz prepara-se com todo o cuidado para a grande experiência. Tinha lido e relido as instruções, estava preparado. Liga a máquina e dirige-a ao seu rosto. Fica uns segundos naquele impasse. Até que decide.
Satisfeito com a sua decisão, o Sr. Arroz guarda cuidadosamente o seu velho pincel.
Mais tarde, dirige-se à drogaria.
Compra um novo pincel, com cabo de madeira envernizada e pêlo sedoso para a sua pele. O sorriso está estampado no seu rosto.
segunda-feira, 10 de março de 2008
Portas de Dublin III
terça-feira, 4 de março de 2008
Vícios Urbanos I
Pisava folhas secas para se entreter. Andava calmamente pelas ruas, pelos trilhos das folhas secas, a ouvir a música das folhas que se desfaziam. Por vezes, um montinho desiludia sem se fazer ouvir. Folhas húmidas, que ainda não tinham tido tempo de secar.
O anoitecer chega, libertando da tarefa de pisar as folhas secas da cidade.
segunda-feira, 3 de março de 2008
Espectadora de emoções
Horas e horas de espera todas as semanas nas chegadas do aeroporto fizeram de mim uma espectadora atenta de emoções alheias.
Voos, muitas vezes escalados, de países de leste, África, Brasil, Europa e por esse mundo fora, trazem familiares separados há muito. O reencontro é cheio de riso, lágrimas e abraços urgentes de quem há tanto não se via.
Sentada numa das cadeiras, olho atenta para tantas emoções. Muitas vezes tive que apertar as mãos para que as lágrimas não caíssem. Mas os olhos, esses, ficavam marejados. Ramos de flores às mulheres que abandonam o seu país para ficarem junto dos maridos. Famílias reencontradas em natais, páscoas e verões.
E, claro, as emoções dos filhos pequenos cujos pais estiveram fora uma semana. E a alegria do reencontro é como se tempos e tempos tivessem passado!
Em qualquer aeroporto, em qualquer cidade, há à espera o espectáculo das emoções que não nos pertencem.
Subscrever:
Mensagens (Atom)