segunda-feira, 28 de abril de 2008

Cartas - Preâmbulo [Ela]

28 de Abril de 1912

Lembro-me perfeitamente de me ter apaixonado. Sei exactamente em que momento foi. Ele passava pelo jardim, acompanhado de dois amigos. Eu estava sentada a ler, com as minhas irmãs Alda e Teresa, num banco à sombra. Tinha um porte confiante, que me agradou. Andava e falava, com os passos ao sabor das palavras e da entoação que lhes dava. Sentiu-se observado e olhou para mim. Foi este o momento em que me perdi de amores. Senti borboletas na barriga e senti que mudava de cor. Toda eu devia ser uma palete dos mais criativo dos pintores.
Sorriu frontalmente para mim e eu desviei o olhar e voltei ao meu livro. Sentia-me envergonhada por ter sido apanhada de modo tão impróprio e estava irritada com ele, por ter sorrido daquele modo que me denunciou perante os amigos. Irritada por não poder olhar livremente.
O resto do dia passei entre o perdida e o irritada.
No dia seguinte disse às minhas irmãs que não as acompanhava ao jardim por estar com dor de cabeça. Estava furiosa com ele.
Alfredo, era o nome dele.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Netos e Avós

Os netos, uma menina de quatro anos e um menino de seis, estavam de férias com os avós. Certo dia, receberam um postal dos pais, que estavam de férias algures. A menina, no auge dos seus quatro anos, olha para o postal, estende-o para a avó e diz:
- Avó, importas-te de ler o postal? É que não trouxe os meus óculos!

Alguns dias depois, ainda os netos estão de férias com os avós, a avó está a estender a roupa. O menino começa a observar atentamente a tarefa da avó, com aquela profusa mistura de cores e de molas.
- O que estás a fazer, avó? Estás a enfeitar a corda?

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Ir para a escola

"Deixa-me olhar bem para ti." Esfregou uma manchinha invisível na testa do rapaz, segurando a cara toda com uma mão. "Hmm, agora já estás bem. Dá-me um beijo e podes ir." O rapaz, contrafeito, refilou que não queria nada dar-lhe um beijo. Já ontem lhe tinha dado um beijo e não queria mais e, além disso, estavam ali os outros meninos.

PS - Tinha uma foto para inserir. Mas em cada 10 tentativas de inserir foto, há 7 que falham!

quarta-feira, 9 de abril de 2008

O Reencontro


A lágrima caía pelo seu rosto, sem que ele tivesse autorizado o atrevimento. A sensação percorreu o seu corpo, manifestando tristeza e alegria. Tristeza pela perda, alegria pelo reencontro.
Outra lágrima decide cair pelo outro olho, com a ebulição de sensações.
No fim, era uma sensação de limpeza, frescura - como se saísse de um duche de água fresca.

terça-feira, 8 de abril de 2008

A Rainha

Conversa numa fila parada numa estrada nacional perto do Pinhal de Leiria:
Pessoa 1 - O D. Dinis foi um visionário quando mandou plantar este pinhal.
Pessoa 2 - O D. Dinis era casado com a D. Isabel, não era?
Pessoa 1 - Sim, era.
(silêncio)
Pessoa 2 - Essa D. Isabel era a rainha das Camélias, não era?
Pessoa 1 - Não, essa é a Dama das Camélias, do Alexandre Dumas. A D. Isabel é a Rainha Santa, por causa do milagre das rosas.
Pessoa 2 - Ah, pois claro! Estava a fazer confusão.
(silêncio ainda maior)
Pessoa 2 - Então é por causa dela que há as rosas de Santa Teresinha??

quinta-feira, 3 de abril de 2008

O Exacto Azul



Segurou na agulha e num pedaço de linha azul para coser um botão amarelo ao bolsinho da camisa verde. Toda a camisa era cosida com linha azul. Daquele exacto azul. Para descobrir aquele exacto azul percorreu todas as retrosarias da Rua da Conceição. Todas. Começou numa ponta e acabou na outra. Na outra ponta, justamente naquela última loja. Antes de entrar, faltavam ainda duas ou três lojas para terminar o périplo, estivera prestes a desistir. Sempre a mesma coisa, entrava na loja, cumprimentava as pessoas, tirava a camisa verde do saquinho guardado dentro da mala e perguntava se tinha aquele exacto azul. Não. Não. Não e não, respondiam, invariavelmente, depois de percorrer os mostruários repletos de carrinhos de linha de todas as cores. Todas as cores, menos aquele exacto azul. Até que, enfim desiludida e sem réstia de esperança, entra na loja depois de descansar um pouco, encostada a uma parede que apanhava sol. Fechou os olhos e deixou o sol aquecer o seu rosto já sem esperança de encontrar o exacto azul.
E no fundo de uma gaveta esquecida a senhora da loja finalmente encontra os dois últimos carrinhos de linhas do exacto azul.
Vai para casa, com a camisa verde dentro do saquinho guardado na mala e o carrinho de linha do exacto azul e prepara tudo, como se fosse um ritual a cumprir. A agulha com a linha, o silêncio na casa, para que pudesse estar concentrada, e a tarefa finalmente tem início.
Não era uma grande especialista a coser botões. Picou-se duas vezes e fez um pequeno nó que teve de ser aldrabado.
Mas, no final, nem se notava que tinha sido ela a coser o botão. A camisa verde com botões amarelos e linha azul daquele exacto azul estava como nova.